quarta-feira, 23 de maio de 2007

Sobre caciques e índios na redação

Pego uma carona no que o Cecconi escreveu sobre as experiências dele como funcionário e pobre “porco manipulado” e dou, sem graça nem brilho, meu pitaco de estréia no blog sobre as relações entre editores e repórteres dentro das redações.

Temos todos a convicção íntima de que algo não funciona apropriadamente bem. Como deixou transparecer nosso amigo, o convívio é atritado e pouco produtivo. Isso se deve a um fato muito simples que teima em não entrar na cabeça dos jornalistas. Editores e repórteres fazem negócios diferentes. Negócios que muitas vezes caminham em sentidos opostos.

Repórteres querem e se preocupam em fazer jornalismo. Editores prezam pelo aspecto administrativo da empresa. Há exceções, óbvio, entre os primeiros. Entre os segundos, se houver, não deverá durar muito no emprego.

Repórteres têm o olhar voltado para fora da redação. Se preocupam em pensar pautas que interessem ou sejam importantes para os leitores. Querem ganhar prêmios de investigação, derrubar ministros, fazer barulho, salvar a pátria. Editores querem manter os borderôs controlados, sem fazer barulho, sem chamar a atenção em demasiado para as suas editorias. Bons funcionários não causam problemas, resolvem-nos para o patrão.

Os editores querem equipes dóceis. Que não exijam muito para coordenar. Não querem de jeito nenhum reportagens que provoquem contestações de governadores, cartas de minsitros, processos de bandidos. Querem os departamentos jurídicos ociosos.

Quando foi a última vez que uma investigação jornalística derrubou uma autoridade? Quando foi que jornais e revistas lançaram algum grande caso de repercussão? Quando soltaram seus cães às ruas para apurar verdadeiramente uma história? O jornalismo está andando tristemente a reboque da Polícia Federal e do Ministério Público.

Denúncias feitas por fontes para repórteres não contam mais com a confiança dos editores. Os próprios jornalistas já não contam com essa confiança. E as fontes mínguam num caldo de apatia. Quantas vezes os jornalistas passam o dia atrás de uma boa pauta, apurando, checando, escrevendo. E brigando por espaço na edição do dia seguinte, argumentando, discutindo para descobrir que lançam súplicas contra ouvidos moucos?

Eu sempre achei que os jornais deveriam correr, pedindo aos jornalistas boas matérias para preencher as páginas tão caras do dia seguinte. Mas a mão dessa via está invertida. E os critérios empregados para a publicação de uma reportagem apontam mais para o baixo potencial de dano que as “denúncias” podem ter do que para aquilo que é importante para a sociedade saber.

Cortando por baixo, todos ficam com a mesma cara. Tudo tem o mesmo gosto de canja morna. O resultado disso está numericamente demonstrado nas tiragens. A Folha de S.Paulo, por exemplo, imprime hoje 250 mil, 270 mil exemplares diários. Um terço do que tirava há dez anos. O Gustavo pode dizer o impacto que isso tem para o mercado de publicidade. PV e Álvaro podem testemunhar qual é o nível dos repórteres que entram em contato com as assessorias de imprensa.

Para os leitores o resultado são publicações insossas, sem brilho, sem graça, sem diferenças entre si. O pessoal com seus vinte anos hoje nunca vai assinar um jornal depois que sair da casa dos pais. Não há nada ali que não tenha sido lido antes na internet. E de graça. Não há nada ali que interesse em particular. Não há nada ali que exalte alguma inteligência diferente. Nada que represente uma novidade.

Essa tibieza editorial será a laje tumular do jornalismo.

Um comentário:

Gustavo Spanholi disse...

Muito bom! Realmente parece mesmo que as coisas estão beges. Me lembro das reportagens da Folha na época do Collor e não vejo hoje nada parecido.