quarta-feira, 23 de maio de 2007

Aleluiamania

Fui surpreendido ao ler que o técnico da Seleção, Dunga, provavelmente se valeu de um olheiro eletrônico na sua última convocação. O You Tube teria sido decisivo para fazer Afonso, artilheiro do Campeonato Holandês, vestir a amarelinha. Fato que automaticamente me dá o direito de defender, também por vias digitais, a inclusão de um craque de mesmo quilate na lista.

Há cerca de um mês, passei uma semana de férias em Fortaleza. Peguei alguns dias chuvosos, que me obrigaram a trocar o espetinho de camarão na praia pelo controle remoto na sala.

Num programa esportivo local, a grande polêmica era a seguinte: o treinador do Ceará Sporting Clube (único do Norte-Nordeste a ir pra Conmebol, segundo pôster que li num boteco) estava colocando a estrela Reinaldo Aleluia no banco, para o segundo jogo decisivo da semifinal do Cearense.

Preste bastante atenção leitor, porque não é todo dia que você vê as palavras “estrela”, “Reinaldo” e “Aleluia” juntas.

Os comentaristas da mesa discutiam, argumentavam e se debatiam questionando a afronta que o treinador Marcelo Vilar fazia à torcida. Como assim Reinaldo Aleluia no banco? Um deles chegou a dizer: “A gente logo vê quando o jogador não tem intimidade com a redonda. E se há alguém no elenco do Ceará que sabe jogar bola é o Reinaldo Aleluia”.

Depoimentos indignados nas ruas reforçavam a posição da mesa. A “Aleluiamania” era uma febre de deixar mosquito da dengue enciumado.

E não terminava aí. O apresentador, um gordinho com pescoço de cágado, chama um VT do próprio Aleluia: “É. O torcedor sabe. Eu entro e resolvo”. Humildade à la Romário. Tenho certeza que a TV local está preparando um especial para quando o atacante marcar seu centésimo gol.

Depois de 1 hora, desliguei a TV convencido de duas coisas:

1) Padim Ciço precisa urgente de um marqueteiro, ou Reinaldo Aleluia vai roubar seus devotos fervorosos.

2) É hora de vestir minha sunguinha porque o tempo está abrindo.

Não acredito que paixão tão cega por um futebolista não tenha fundamento. Por isso, levantei a bandeira branca e dei o braço a torcer. Quero ver Reinaldo Aleluia no escrete canarinho. Até porque desconfio que a RBS e a Guaíba não pretendem transmitir tão cedo os jogos do Estadual de lá.

Além do subjetivo que move o amor do torcedor cearense, as razões objetivas para a convocação são evidentes.

90% dos turistas que visitam o Ceará são italianos. Tanto os internacionais quanto os domésticos. É muito natural se deparar nas praias com Rossis, Signorinis, Cannavaros (leia com aquela pronúncia do Vanucci) e, veja você, até Spagnolis. Ora, a pátria campeã mundial de futebol não aterrisaria por acaso naquela parte do Brasil.

Galvão Bueno jactaria-se. Depois de Romário, Ronaldo, Rivaldo e Ronaldinho Gaúcho, o “R” de Reinaldo Aleluia inflaria seus pulmões, subiria lancinante pela traquéia, sacudiria sua língua e arremessaria prazerosos perdigotos no rosto do Arnaldo.

Pro Governo Lula, seria excelente ter um representante da região que mais votos lhe deu, o Nordeste, na Seleção. Já pensou o Aleluia marcando um gol em Wembley, tirando a roupa na comemoração, sendo preso e dando entrevista na BBC? “Nenhuma costela aparecendo. É o sucesso do Fome Zero no Brasil!”. Pensando bem, Ronaldo Ex-fenômeno já cumpre bem essa função.

E a Igreja Católica, hein? Pra conter a migração de fiéis, que tal a imprensa inteira bradando “Aleluia!”?

Acabo de acessar um site esportivo e descubro que o atacante foi colocado pra treinar em separado do grupo principal. Lógico. Com a Copa América agora em junho, certamente já está se preservando.

Um comentário:

Alvaro Bueno disse...

Pelo menos tu entendeu o que eles falavam. Experimenta ver um programa de mesa-redonda que passa na TV Barriga Verde (SC). Quando o debate pega fogo, eles soltam uma matraca verbal e parece que eles começam a falar uma outra língua a direita toda vida.