sexta-feira, 15 de junho de 2007

Geopolítica e apnéia: duas lições de um primo bobão

Era verão. Estávamos recuperando uma das heróicas greves da UFRGS, daquelas que não devem ter dado em nada além de fazer-nos aproveitar as férias de verão na praia em abril e maio. Nunca passei dias mais desolados em Imbé.

Um primo do PV, do qual nunca seria capaz de lembrar o nome, estava passando uns dias hospedado na já então famosa casa da Vila Jardim. Acho que devia ser fim de semana, e o Cecconi e eu fomos até lá para passar a tarde brincando com os dois primos.

Nessa tarde, fomos jogar um arremedo de pólo aquático em uma piscina de mil litros, em que todos davam pé. Não sei por que achamos que isso ia dar boa coisa. Os times foram divididos por critérios genéticos: arianos puros contra a família Magalhães de Oliveira.

Os gols eram duas cadeiras de plástico colocadas nas bordas da piscina. Obviamente, a pacífica recreação logo tomou contornos de uma nem tão civilizada batalha campal.

Em um dado momento do jogo, o primo do PV pegou a bola e não respondeu positivamente aos pedidos educados que Cecconi e eu dirigimos a ele para que entregasse sem resistência a bola para o nosso time.

Como ele mostrasse uma força de vontade surpreendente (apesar de suicida) em resistir aos puxões para tirar a bola dos seus braços, Cecconi e eu tivemos quase ao mesmo tempo uma idéia que poderia resolver a situação sem prejudicar o espírito esportivo de lealdade que até então coroava a disputa.

Submergimos o primo do PV. Levado por um reflexo ancestral que manda aniquilar o adversário, coloquei o joelho sobre o peito do infeliz, enquanto o Cecconi segurava os braços do cuidado. Lembro de algumas bolhas de ar subindo à superfície, enquanto o PV gritava algo como: “Meu primo! Não afoguem o meu primo!”

Esse acabou sendo o último lance da partida. Por alguma covardia descabida, o time dos Magalhães de Oliveira abandonou a piscina e deixou a vitória para os valentes arianos.

Mas as desventuras do primo do PV naquela tarde estavam apenas começando. Recuperado da apnéia forçada, ele provou ser totalmente desprovido de empirismo, pois logo depois fomos jogar WAR. E ele confiou cegamente na minha lealdade esportiva.

Em todas as nossas partidas de WAR uma estranha coisa acontecia com freqüência: tanto na minha carta de objetivos como na do Cecconi vinha escrito “Eliminar os exércitos do PV, onde quer que eles estejam”. Estranho, mas regras são regras.

Nessa partida em particular, eu fiquei posicionado nas Américas do Norte e do Sul, mas o PV estava dividindo a Ásia e a Europa com o primo dele. Pelo que me lembre, com seus talentos de marechal-de-campo, o Cecconi ficou restrito à África do Sul depois de cinco rodadas.

No decorrer do jogo partimos para a tática em que éramos mais competentes: a formação de alianças de não-agressão com o objetivo de deixarmos frentes livres para atacar o beiçudo. Uma dessas alianças foi firmada entre o primo do PV e eu. Não nos atacaríamos entre a América do Norte e a Europa.

Depois de trocentas rodadas em que provei ser incompetente para atravessar o Estreito de Bering com os meus exércitos setentrionais, comecei a colocar todas as unidades que ganhava a cada rodada no território de Labrador. Logo, tinha formado um paredão de peças ao lado da Islândia, que o primo inocente defendia com um único exército. Confiante que eu nunca iria romper o tratado.

A cada rodada que passava e que o priminho deixava de colocar peças na Europa, e PV dava gemidos de agruras, derramava lágrimas de ódio malcontido e tentava ser irônico e indireto com frases do tipo: “Tem gente burra no mundo, mesmo. O Café está colocando os exércitos ali para quê será?!”

Obviamente, o tratado foi quebrado, o primo bobão foi varrido do jogo, o PV apanhou durante algumas rodadas. E o Cecconi, que tinha ficado quieto juntando exércitos na África do Sul, ganhou o jogo ao dominar 18 territórios.

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